Deus e o Diabo, sentados em poltronas, a luz de um abajur
Deus: e o que a gente faz com isso?
Deus: e o que a gente faz com isso?
Diabo: ora, você fez tudo sozinho e agora quer me incluir no problema?
Deus: você se incluiu sem ser chamado, serpentino.
Diabo: foi uma participação especial, uma cena curta; não diria que foi uma intromissão.
Deus: pois foi uma intromissão, sim. E, agora, eles não entendem mais nada do que eu disse.
A culpa é sua.
Diabo: “Culpa, culpa, culpa…”. Você fica com essa conversa e eles acreditam!
Nunca são responsáveis por nada. Sempre a culpa é minha. Você e a sua mania de perfeição.
Tá mimando eles, sabe disso, né? Tá estragando. Olha ali… tão perdidinhos.
Deixa eles se virarem! Você subestima a sua própria criação, Altíssimo.
Eternidade, infalibilidade… isso tudo é tão chato, tão retrô.
Deus: VOCÊ ESTRAGOU O AMOR!
Diabo: Eu aperfeiçoei! Deixei interessante. Você queria que estes seres dotados
de tanta volúpia se embrenhassem em uma eternidade de aprisionamento, oh, Soberano.
Eles agora são livres para a descoberta! Livres!
Deus: E a gente deixa assim? Sem propósito? Sem um “felizes para sempre”?
Não sei se gosto dessa ideia. Acho confuso. Eles vão se magoar o tempo todo.
Lágrimas, sofrimento...
Diabo: Pois muito que bem! Assim eles sentem! Não é sentindo na pele que se assegura
de se estar vivendo? Deixa que chorem. Você os subestima. Parece até que eu os conheço melhor…
Deus: Não ouse! Eu os criei e sei para o que os criei.
Diabos: E eu apenas ensinei outro caminho. Eles são os mesmos.
Só vão pulsar mais. Você os transbordou de amor. Eu os ensinei a derramar em vasilhas diferentes.
Fazemos uma boa dupla!